Eu vou ser titia e estou sentimental. Três histórias para celebrar a ocasião.
Tem mais cachinho que cabelo – como pode? Minhas férias estavam fadadas à cabeceira dos doentes da família, nenhuma viagem distante possível naquele ano, mas as visitas de Lavínia valiam por muitos quilômetros percorridos em desconhecidas paisagens.
O SORRISO DO LEÃO. OU: DENTE POR DENTE
– Vem, Lavínia. Vou te mostrar uma coisa – e guiei-a pelo jardim, mais mato do que canteiro.
Colhi a pequena flor e assoprei-a, bolota de pelúcia branca que se desfez sem resistência. Lavínia maravilhou-se. “O que é isso?”
– Dente-de-leão. Quer pegar mais?
Reuniu todo o espanto do mundo nos olhos. “Não! Ele vai me morder!”
Todos caem na gargalhada. Ela também, mesmo que desinteirada por completo da graça. E logo: “Não vai não, né? O dente aparece é quando ele ri, né?”
BURACO NEGRO
Da grama, a noite era tapete estendido pro olhar. Nenhuma lembrança acessível de céu mais estrelado. Longe de tudo, de volta à casa da nossa já remota infância, era ali o lugar exato para estarmos o mais perto possível de onde queríamos – de onde precisávamos?
– Uma estrela cadente!
– Também vi!
– Outra!
Tantas. Não acabava mais. E Lavínia: “Eu também tô vendo as estrelas”.
– Você tá vendo, bebê? – (para a mãe, ainda era bebê: três anos, apenas) – Não essas estrelas que estão piscando, umas que passam riscando o céu, assim ó, são as estrelas cadentes, é como se elas estivessem caindo, sabe?
“Hum”.
– Eu vi!
– Agora eu vi!
– Olha aquela!
– Nunca vi tantas!
E então Lavínia abriu o berreiro. “Não quero as estrelas caindo! Não vai sobrar nenhuma quando eu crescer!”
A MATÉRIA DOS SONHOS
Dessas pequenas glórias, que sem erro são as mais grandiosas, eu devia não falar, mas: quem apresentou Lavínia às bolhas de sabão fui eu.
Era aniversário da minha mãe. Tinha bolo, eu, meu pai, meu avô, três tias. E aí chegaram o Tio da Vó e Lavínia. O que há para crianças numa casa onde a última cresceu faz tempo?
Havia as revistas do meu portifólio e, numa delas, o brinde das super-bolhas. Abri o pacote (shrink quente, em termos técnicos), peguei o vidrinho (por um feliz acaso, era cor de rosa – Lavínia não se furtava ao clichê da cor preferida) e soprei. Para quê esses olhos tão grandes?, diria a Chapeuzinho, se Lavínia fosse o lobo.
Estendeu a mão, a bolha de sabão estourou assim que encontrou seu dedo: cadê o arco-íris que estava aqui?
Mais um sopro, muitas bolhas. Lavínia seguiu-as com os olhos, estupefata – dificilmente usarei esse adjetivo de novo com tanta propriedade – segurou minha mão, me encarou sem piscar e perguntou: “Era dentro de você que elas estavam?”